O
fogo não dorme ou desdorme: ele só
sabe ser.
Em estado de latência,
é brasa - jamais fogo.
Há sempre
a necessidade da fagulha, o início acanhado, a tímida
aparição em arremedo de labareda a
perscrutar o mundo com a infantil curiosidade da chama. E, então,
a avidez.
Essa guimba acesa, lançada
ao ar, carrega a potencialidade de um tempestuoso discurso de um mar de chamas.
Cai em um terreno vazio, aninha-se sem
jeito, sobre o mato seco, nos últimos estertores de um definhar
indolor.
A brasa roça
o mato, a se contorcer num desejo quase impossível
de escapar.
Uma brisa lambe a brasa, aviva-lhe a
vontade de se agarrar à vida, de consumir todo o resto do
papel, que pouco ainda há.
A brisa dá
uma volta sobre a vegetação
seca, abraça o resto do cigarro com braços
de vento e ajuda a brasa a vencer a frágil
resistência do mato.
A fagulha.
Uma pequena chama ergue cabeça,
tronco e membros sobre a pele esturricada do chão.
A brisa segue rodando uma cumplicidade involuntária,
animando a chama a derivar-se sobre o esqueleto seco do que foi uma vegetação.
Logo o fogo se ergue em vistoso corpo,
consumindo rapidamente suas infância e adolescência,
que não lhe interessam.
É agora um mar em sinfonia a crescer em
cheia maré sobre um leito que lhe alimentará
a caudalosa vigília enquanto permanecer seco.
O fogo só
sabe ser.
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