1.4.05

Ausência cheia

A mulher senta-se em um dos bancos da praça, aperta um joelho ao outro, inclina ligeiramente as pernas, coloca a bolsa no colo, abraçando-a.
Algumas crianças correm em redor dos jardins, mães dividem o tempo entre os filhos e as conversas com outras mães, um homem descansa sua solidão embaixo da sombra de uma árvore. Ela olha todo o movimento sem prestar muita atenção. Procura por ele que, como sempre, deve vir de mansinho e assustá-la. Não quer deixá-lo perceber que o viu chegar – adora a expressão dele quando ela contrai o corpo e solta um “ai que susto!”
As mãos se esfregam uma contra a outra, apertam a alça da bolsa, mantém os joelhos unidos. De tempos em tempos, endireita o corpo, eleva a cabeça, girando-a despretensiosamente a fim de vigiar a praça.
Abre a bolsa, retira um estojo de maquiagem, retoca o batom. Aproveita o espelho do estojo para ver se ele chega pelo outro lado da praça.
Dedos longos de um vento frio alisam a face da mulher, enxugando o suor que ainda não se podia ver. Ela oferece o pescoço, cerra os olhos e suspira pelo ligeiro prazer que sente.
O vento sopra um pouco mais forte; mexe com delicadeza nos cabelos da moça; levanta folhas presas em um sono sem tempo, depositando algumas aos pés da mulher; mistura aromas de flores, de terra, de grama, criando incenso único que purifica a ansiedade da moça.
Todo o corpo da mulher é espera. Tudo o que sente tem o nome do homem que vai chegar, tem o som de sua voz a lamber-lhe os ouvidos, tem a força de suas mãos a apertar-lhe os braços, a abraçar-lhe a cintura.
Enquanto o homem não chega, o vento segue envolvendo-lhe o corpo, beijando-lhe os lábios com a fluidez de lábios sem carne, sussurrando-lhe o amor, que alimentará ainda depois de o amado chegar.