11.8.06

Aos peixes que plantei

Dentro de um aquário, os peixes são folhas de árvore sem tronco a se moverem na aragem da água. Vasculham cada milímetro do pequeno espaço em que vivem sem se cansarem com a repetição da paisagem; deslumbram-se com a imobilidade de uma sempre e mesma pedra; nadam, crianças encantadas, por entre o verde perene de plantas artificiais.
Em um canto da sala, dentro das paredes de vidro que faziam meu aquário, plantei uma dessas árvores, feitas de folhas pequenas e coloridas. Gostava de relancear olhos para ver a agitação dos pequenos animais, que pareciam prestes a serem arrancados por vento tempestuoso e constante. Havia prazer em, ao alimentá-los, vê-los vir à tona com a voracidade da última e definitiva refeição. Sentia-me relaxado em ouvir o som da bomba irrigando a água com o ar de que eles necessitavam. Deixar a sala no escuro, iluminada apenas pela luz que acendia o aquário, fazia-me ter a sensação de que o mundo era feito daquela água, daqueles peixes – e alimentava a saudade dos mares que me envolvem.
Essa semana, cheguei em casa, fui alimentar os animais e surpreendi-me: todo o líquido que os sustentava havia-se esvaído por inexplicável rachadura na parede de vidro. Os peixes – todos eles, toda a folhagem multicor de minha árvore sem tronco – repousavam eternidade sobre o leito de pequenas pedras azuis.
Peguei-os, um a um, e os plantei em meu jardim.
Todas as noites, quando a escuridão abraça minha casa e respira dentro de minha sala, acendo a luz do aquário, fico olhando a água estéril em folhas. E pacientemente aguardo a colheita.

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