1.11.05

Meu mar

Todas as noites, eu escancarava a janela do meu quarto para deixar entrar o mar. O som das vagas escorregava pelo meu aposento, acomodava-se ao lado do ruído das teclas do computador, fazia companhia ao volume baixo do toca-cd.
Eu me deitava e alongava o sono, escutando gemidos de ondas quebrarem na praia que minha casa não possui.
O mar vagava pelo correr sem tropeços do vento nas folhas dos pés de eucalipto plantados no terreno ao lado.
O vento jogava as folhagens de lado a outro, escorria desembestado nas ramagens verdes – e todas as árvores gritavam o lamento que me era idêntico aos gritos das ondas do mar.
Eu batizara a escuridão da noite de Isla Negra, e acreditava que em seu corpo ausente de luz, ela escondia o mar que eu ouvia e não tinha. E assim como para Neruda, o mar era grande demais e estava colocado em minha janela.
O mar que eu ouvia e não tinha.
Ausente por alguns dias, retorno e chego quando o sol moveu seu furor para outras paragens. Abro a janela, escuto – e não ouço. Vigio o escuro, faço perguntas a minha Isla e só recebo silêncio.
Alguém levou meu mar embora. Cortaram-no e o tornaram lenha. Transmutaram em fogo, o meu mar.
Ruidosamente silenciosa, a noite já não entra pela janela do meu quarto, abafada por aquela que sai dele – que tem o tamanho e o sal dos mares.