7.2.08

Sobre a terra, o peso

A lâmina da enxada inicia a descida, terminada em certeiro golpe sobre o resto do último mato. Pronto. A terra, nua. Torrões revoltos enchem de cicatrizes o terreno. O solo sangra seco sangue nas feridas abertas, enquanto o mato se esturrica em amontoado de pequenos caules e folhas. Dêem-lhe alguns dias e alguma chuva, e a terra novamente trará o verde, vestindo-se em silêncio como em silêncio foi despida. Mas essa chuva, esse tempo não haverá.
Amanhã ou depois, uma máquina, com boca de mandíbula única, nivelará o terreno; uma broca esfomeada abrirá buracos, criando montes com a terra da qual parecia se alimentar; uma picareta será precisa em enredar o solo com valas.
Então, lentamente, as paredes crescerão sobre o terreno, um teto as unirá em um só ser, um telhado as abrigará.
A pele da terra, pela qual a água penetrava, antes tatuada com rasteiras plantas e ervas-daninhas, carregará sobre si a verruga de uma casa; o chão livre de pegadas, pois tocado pelos inexistentes pés das luzes, comprimir-se-á ao peso de tijolos e cimentos e pedras de concreto.
Atlas sem ombros, a terra sustentará o peso do mundo que não criou nem pediu.