7.2.07

Escuta o rumor de meus galhos

Sempre gostei de desenvolver teorias absurdas e defendê-las para você. Adoro perceber seu espanto quando, no meio de uma conversa séria, eu inicio um assunto perguntando, por exemplo, se você sabia que as novas gerações de esquimós tinham a pele mais e mais clara para não serem tão facilmente atacadas pelos ursos polares; ou então eu dizia que os monges tibetanos, cansados de sofrerem opressão pelo governo chinês, decidiram-se por abandonar suas crenças, a renegar sua fé.
Você arregala olhos, meneia a cabeça, entende o disparate e nós rimos, especulando as conseqüências de cada uma dessas idéias malucas. Depois eu te beijava, despedia-me e ia para minha casa.
Um dia, pouco antes de decidirmos que não mais haveria minha casa ou sua casa, mas a nossa, eu disse algo em que realmente acredito, apesar da estranheza do pensamento: os homens, somos todos árvores.
Você riu até mais não mais poder. Eu permaneci sério. E nada disse.
Não consegui te dizer que homens e árvores olham a passivamente a paisagem; que uns e outras se fixam no solo que melhor os acolhe; que ambos abrem-se em corpos e copas ao Sol; não te disse que homens e árvores subjugam-se ao marulhar manso das águas dos rios.
Não te disse nada disso. Mas quero dizer da árvore que eu era e daquela que agora sou.
Antes eu tinha você, voltava para minha casa e estendia raízes por entre escada e sala e cozinha, espraiava galhos por jardim e grama, plantava-me no vasto solo de meu quarto. Agora eu tenho você, volto para nossa casa e permeio minhas raízes entre as suas; meus galhos fazem rumor por entre os seus, tecendo a folhagem de nossas conversas; planto-me na fértil terra de amor de nosso quarto; deixo que a pele de meu tronco procure a sua pele em nossa cama.